Hoje em dia a Mercedes faz carros principalmente para o mercado dos fatos algodão, telemóveis com mais engenhocas que o Q e laptops com uma maçã desenhada na tampa. Olhando para o Classe S tem-se o exemplo perfeito. Anos luz à frente de qualquer outra coisa na estrada neste momento em termos de tecnologia, über-confortável e brilhante nas autoestradas - essencialmente um escritório na Vila Expo sobre rodas. Isto não é, de modo algum, uma coisa má, especialmente se você for um executivo um nadinha para além da meia idade que começa a ser ligeiramente incomodado por uma artrite. Mas se for como nós vão achar tudo isto meio enfadonho, desviado do que um carro "de condutor" deve ser.
Até os Mercs mais desportivos (os mais terrenos, claro) têm os seus problemas como a posição do volante - que com todo o seu tamanho mais parece um leme - que nunca é bem à nossa frente, as caixas manuais - coisa que a Mercedes nunca aprendeu a fazer funcionar como deve de ser - e, é claro, o ESP que nunca ficava realmente desligado quando queriamos puxar pelo carro.
A meu ver, desde os anos 50 que a Mercedes não tem um carro focado para o condutor (mais uma vez, tirando o SLR, no qual a McLaren teve mão e o GTR, do qual só fizeram 25). O 300 SL foi o derradeiro automóvel no seu tempo porque foi adaptado do modelo de competição e, é claro, isso tinha alguns custos. O sistema de refrigeração levava uma quantidade enorme de óleo para lidar com o calor do motor, que em competição era muito, mas no dia-a-dia isto significava que muitas vezes o motor nunca atingia a temperatura óptima. E é claro, tínhamos o bloco de betão ao qual a Mercedes chamava pedal da embraiagem, que vos esmagava os rins após algumas horas ao volante. Mas se virem bem, era 1954. Que outros carros podem comparar ao Gullwing?
A linhagem SL tem vindo a melhorar, mas continuam a ser banheiras de passeio, tão pesados que têm o seu próprio campo de gravidade. Espectaculares no sítio certo, mas demasiado grandes e pesados para se abusar deles numa pista. Entra em acção a AMG, o departamento de magia da Mercedes. Um grupo de tipos de Estugarda que adoram carros, e que percebem que o S 320 CDI é para executivos com hemorróidas, e que há outro mercado no qual a BMW é líder, mas a Mercedes ainda tem uma última palavra a dizer. E dentro deste estúdio mágico da AMG há ainda um departamento que se especializa em feitos monumentais - fazer desaparecer a Torre Eifel com um lençol, mover o Evereste e o CLK 63 AMG Black Series.
O CLK 63 AMG é, em si, um verdadeiro monumento à engenharia. Um V8 de 6.2 litros a debitar 475cv, sem turbos nem superchargers, é realmente um marco na história da AMG. Mas os rapazes da Black Series disseram "nah, não chega", e em vez de ficarem a criticar a Mercedes como um deputado do PCP, colocaram de facto mãos à obra e mexeram com o motor até lhe tirarem 507cv. Depois pousaram a varinha mágica e colocaram apetrechos de corrida em todo lado, incluindo inúmeras peças em fibra de carbono.
O que resultou deste número de magia foi o que vocês conhecem como o Safety Car da Fórmula 1. Um carro incrivelmente, selváticamente, verdadeiramente rápido. E o som, meu Deus, o som. Imaginem o maior trovão que já ouviram a saír do escape. Mas ao contrário da trovoada, quando estão ao volante do Black, tudo isto parece anjos a acariciarem os vossos tímpanos. Simplesmente brutal.
É claro, uma vez que o Black tem base no CLK, herdou alguns dos seus problemas, como a posição do volante e o volante em si. Mas isto são ninharias num carro destes. Pena é o preço, que nem sequer vou mencionar para não vos influenciar quando virem uma destas maravilhas.
Finalmente, a Mercedes conseguiu o que tentava há muito - um Merc que honra a sua linhagem desportiva. O CLK 63 AMG Black é, provavelmente, o melhor Merc desde o 300 SL. Não é exactamente tão virado para o condutor como um Aston ou um Ferrari, mas é um começo... Um bom começo! JN